segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Texto 5 - Sobre ser são em lugares insanos

David Rosenhan resolveu fingir-se de louco. Em 1972, ele se dirigiu a um hospital psiquiátrico americano alegando escutar vozes. Essa foi a única mentira que contou. Comportou-se de maneira calma e respondeu a perguntas sobre sua vida e seus relacionamentos sem mentir uma única vez sequer. Outros oito voluntários sãos fizeram a mesma coisa, em instituições diferentes. Todos, exceto um, foram diagnosticados com esquizofrenia e internados.
Assim que foram admitidos, os pacientes passaram a agir normalmente. Observavam a tudo e faziam anotações em suas cadernetas. No começo, as anotações eram feitas longe do olhar dos funcionários, mas logo eles perceberam que não havia necessidade de discrição. Médicos e enfermeiros passavam pouquíssimo tempo com os pacientes e nem ao menos respondiam às perguntas mais simples. “Apesar de seu show público de sanidade, nenhum deles foi reconhecido”, escreveu Rosenhan em “Sobre Ser São em Locais Insanos”, publicado em janeiro de 1973. Ironicamente, os pacientes reais duvidavam com freqüência da condição dos novos colegas.  Sua internação, assim como a dos outros voluntários, era parte de um estudo pioneiro para avaliar a capacidade médica de diagnosticar distúrbios mentais. 
Os falsos pacientes foram medicados e liberados com o diagnóstico de “esquizofrenia em remissão”. De volta à sua identidade real, os pesquisadores requisitaram os arquivos sobre suas estadas nos hospitais. Em nenhum dos documentos havia qualquer menção à desconfiança de que estivessem mentindo ou que aparentassem não ser esquizofrênicos. A conclusão que David Rosenhan escreveu para o estudo desconcertou a psiquiatria americana. “Agora sabemos que somos incapazes de distinguir a insanidade da sanidade.”
O estudo de Rosenhan deixa claro que o problema não eram as mentes dos ingleses e sim a maneira pouco eficiente de se fazer diagnósticos.  E essa era uma das questões centrais do estudo de Rosenhan. “Será que as características que levam alguém a ser tachado de louco estão mesmo no paciente ou estão no ambiente e contexto em que o observador está inserido?”, escreveu ele.
Este conceito - a loucura – pode ter várias interpretações e definições, pode mudar diante de conceitos como geografia e tempo.  E o mais fácil nem sempre é o melhor.  Talvez seja a hora de começarmos a lidar melhor com as nossas próprias neuroses, manias e loucuras. E, sobretudo, aceitarmos nossas diferenças.

SLATER, Lauren- Sobre Ser São em Lugares Insanos – Experimentos com Diagnósticos Psiquiátricos. Mente e Cérebro, (p.82-115):Traduzido por Vera de Paula Assis.- Rio de Janeiro : Ediouro Publicações Ltda., 2004.

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